Economia

Investimento anjo anual em startups alcança R$ 1 bilhão no Brasil, aponta ABStartups

Embora expectativa seja de retração em 2020, segmentos nas áreas de edtech e healfhtech mantêm curva ascendente. Educação e saúde são maioria dos negócios em startups no CE

Marta Bruno

martabruno@ootimista.com.br

Desde que as startups passaram a ser consideradas por indústrias, administração pública, comércio e serviços como solução tecnológica de mercado para problemas reais, o ano de 2019 foi o mais promissor para o setor. O volume de investimentos em startups somou, no país, pela primeira vez na série história, R$ 1 bilhão, registrando aumento de 9% em relação a 2018.

Para o Ceará, o modelo que se desenhou ano passado está gerando frutos, especialmente em setores cuja demanda por soluções se potencializou com a pandemia. Prova disso é que, segundo o último levantamento da Associação Brasileira de Startups (ABStartups), dos 81 negócios do tipo em operação no Ceará, a maioria é em educação (15%), saúde (10,6%), atacado e varejo (também 10,6%). Se nacionalmente há perspectiva de retração em investimentos no setor, no estado há negócios que cresceram 500%.

De acordo com relatório divulgado pela Anjos do Brasil, entidade sem fins lucrativos que incentiva investimento de risco e apoia o empreendedorismo inovador no país, a superação de R$ 1 bilhão nesse tipo de investimento ultrapassou pela primeira vez a série histórica. No entanto, o organismo prevê retrocesso neste ano, equiparando-se às aplicações efetivadas em startups em 2018. “Esse é um ano muito desafiador, a cada mês é um panorama diferente. Sofremos um impacto muito grande final de março e abril. Os investidores tiveram que voltar para suas casas, redefinir projetos, planos, principalmente nas startups já contempladas com investimentos. Com isso, eles pararam de olhar para as novas, as que estavam em busca de captação. Essas não receberam nenhum tipo de atenção. Por outro lado, apoiaram as outras, colocando até um pouco mais de capital”, explica a diretora executiva da Anjos do Brasil, Maria Rita Spina Bueno.

Depois disso, em maio, o interesse em novos projetos retornou. Em junho, projetos que estavam em fase de captação antes da pandemia voltaram a ganhar atenção. “O interesse voltou talvez até nos níveis de pré-pandemia. O que deve haver é uma diminuição no montante investido. Pessoas físicas, anjos, tiveram que investir parte do seu montante nos seus negócios, então eles estão um pouco mais cautelosos. Por isso há previsão de diminuição no volume investido”, diz, acrescentando que o investidor anjo aplica em uma média de três ou quatro startups simultaneamente.

Para Maria Rita, a projeção é que os investimentos diminuam em torno de 10%, voltando aos níveis de 2018. Isso deve ocorrer local, regional e nacionalmente, segundo ela. “O ecossistema está se tornando mais maduro, mas passamos por uma situação muito delicada”, pondera. A diretora acredita que setores que geralmente suscitam interesse de investidores devem se manter em alta, em especial aqueles ligados à indústria e a empresas e que geram soluções em educação, saúde e agronegócio, por exemplo. Em relação à saúde, temas ligados à telemedicina estão em alta, pois a prática foi regulada nacionalmente, o que gera interesse extra e mais segurança para investidores.

Outro setor que se mostra atraente é o e-commerce, que teve aceleração de comportamento motivada pela necessidade de isolamento social. “Muitas pessoas que não pensavam em fazer supermercado online não só estão fazendo como vão manter a prática”, sinaliza. No caso da agricultura, que naturalmente suscita interesse em investimento, deve ganhar mercado devido às transformações de mercado no segmento, com nova geração de processos e produtos.

Os entraves, para Maria Rita Bueno, estão na administração pública e na legislação para o setor. “O governo não consegue comprar inovação. A legislação é muito complexa. Mesmo que o empreendedor traga solução, e que é tão importante, dificilmente consegue vender para o setor público. Se a gente pensar em educação, de 80 a 90% da educação é pública, não é privada. O empreendedor está atuando com um pedaço muito pequeno do mercado. A pandemia evidenciou isso, fez com que as diferenças aumentassem”, analisa.

Para ela, se governo mudasse a legislação, destravasse, dentro do Marco Legal de Startups que tramita no Congresso Nacional, critérios de acesso à inovação tornariam a tecnologia mais democrática. Além disso, a diretora executiva considera que a legislação trabalhista precisa abranger novas formas de trabalho, como o empreendedor de negócios de base tecnológica. “São novas formas de trabalho que precisam ser contempladas. O que é melhor, que se atue sem uma legislação adequada, dentro da que existe, ou que se tenha uma boa legislação? Melhor que se tenha uma legislação adequada”, ensina.

Agenda Edu alcança 2,8 milhões de usuários em mais de 2.500 escolas no país

As agendas escolares, tradicionalmente utilizadas para estabelecer a comunicação diária entre família e escola, nunca estiveram tão vazias. Antes carregadas de bilhetes, avisos formais, convites de aniversário e páginas a serem preenchidas, as informações do livro de registros migraram para o ambiente digital devido ao isolamento social e à necessidade de aulas remotas. A mudança na forma de acompanhar a rotina escolar impactou diretamente na Agenda Edu, startup nascida no Ceará há seis anos e considerada, em 2019, a melhor no mercado nacional. Com a vida escolar restrita ao ambiente digital, a quantidade de usuários únicos saltou de 500 mil em janeiro para 2,8 milhões em julho.

Com tamanho crescimento, as mensagens trocadas no aplicativo aumentaram quatro vezes, enquanto os eventos foram multiplicados por dez. Atualmente, mais de 2.500 escolas utilizam a edtech para conectar pais, unidades de ensino e professores. Para Para o CEO e co-founder da Agenda Edu, Anderson Morais, a pandemia colocou a plataforma na liderança do mercado de edtechs. Mas, de início, os planos da então equipe participante do II Startup Weekend Fortaleza, em 2014, nem eram tão grandes. Ao elaborarem a primeira ideia da startup, os quatro sócios tinham como base o desejo de trabalhar com educação e a necessidade de atender à demanda de um dos envolvidos, cuja filha deixou de ir fantasiada para uma festa na escola porque pai e mãe não viram o aviso na agenda.

“A gente nem se conhecia, mas naquela sexta-feira à noite, no evento, já começou a trajetória com propósito. Refletindo sobre a comunicação entre pais e escolas, pensamos que ali havia um problema. Além dos custos, da segurança de dados, o tempo que a professora levava para conferir cada agenda não parecia sustentável”, justifica. Foi então que a ideia passou a ser trabalhada no sentido de atuar na gestão da comunicação e engajamento de ambientes escolares, primeiro como Agenda Kids, mas logo passando para o nome atual devido à ampliação de atendimento na educação básica e cursos de idioma.

De acordo com Anderson Morais, a maioria das escolas que utiliza a plataforma não tem agendas físicas. “Ter uma ferramenta digital e analógica simultaneamente só é viável em um momento de transição. Mas, incorporada a agenda digital, não faz sentido manter a de papel. Na prática, o sentido é simplificar”, analisa. Isso porque a Agenda Edu congrega informações e comunicação sobre atividades do aluno, comunicados, eventos, mural de fotos, pendências escolares e comunicação direta entre pais e profissionais de educação.

Daqui para a frente, após incrementos nos negócios de base digital, motivados pela pandemia, Morais acredita que o momento é de transformação nas relações pessoais e profissionais. “Várias coisas estão sendo ressignificadas: consumo mais consciente, a urgência de grandes companhias acompanharem a velocidade de inovação das startups, necessidade de mais investimento no setor, internalização da capacidade de inovar”.

Para o CEO, há uma ambiência nacional que favorece o desenvolvimento de startups. Nos últimos anos, mais de R$ 10 bilhões já foram investidos nesses negócios. Com a pandemia, as soluções digitais ganharam maior projeção. “Agora é muito mais fácil. O mundo está sem fronteiras, tudo está ligado a um cabo de rede. É possível empreender de qualquer lugar”, motiva. O Ceará, na opinião do empreendedor, está no caminho certo, reunindo atores das esferas pública, privada e do meio acadêmico para encontrar soluções que cheguem ao consumidor e às empresas.

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