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Especialistas defendem abordagem mais ampla no enfrentamento às fake news

Para especialistas, apesar do avanço do tema, é necessário aprimorar essas ferramentas

Governo do Estado também criou um portal de checagem de informações, o Antifake CE (Foto: Caio Rocha/FramePhoto/Folhapress)

Renato Sousa
rsousa@ootimista.com.br

O combate às notícias falsas e às campanhas de desinformação nas redes sociais – as chamadas fake news – tornaram-se pauta com a ascensão das redes sociais. Entretanto, as estratégias adotadas não são desprovidas de polêmicas. Por enquanto, são três os Estados brasileiros que já aprovaram legislação contra as fake news: Acre, Paraíba e Ceará.

“Tenho críticas às punições e ausência de procedimento, já que as fake news são muito difíceis de serem aferidas”, diz Diogo Rais, professor de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, e diretor do Instituto Liberdade Digital. Segundo ele, no caso específico do Ceará, aprovou-se uma legislação muito vaga. “(A lei) exige o dolo e o falso (conteúdo), e os dois são difíceis de aferir, ainda mais em processo administrativo, sem devido processo”, declara.

O texto aprovado pela Assembleia Legislativa, de autoria de Augusta Brito (PCdoB), estabelece multa para quem “dolosamente divulgar por meio eletrônico ou similar noticia falsa sobre epidemias, endemias e pandemias no Estado”, deixando a regulamentação para o governo estadual. O Otimista não conseguiu contato com a parlamentar.

Na justificativa da matéria, ela escreve que “nossa preocupação é com aqueles que, sob o anonimato e com interesses escusos, divulgam informações sabidamente falsas, especialmente em meio digital e nas redes sociais, gerando instabilidade, pânico, danos morais, patrimoniais e em casos mais graves a morte”.

O caminho escolhido pela parlamentar não é efetivo, segundo Helena Martins, professora de Comunicação Social na Universidade Federal do Ceará e membro do coletivo Intervozes – organização que atua na área da comunicação social como direito humano. “Esse tipo de medida responsabiliza o cidadão que compartilha, mas sabemos que hoje há toda uma arquitetura das plataformas digitais que permite a desinformação, e grupos que atuam de forma paga, industrial de fato”, declara a pesquisadora.

De acordo com Martins, o Intervozes não é favorável ao uso da lei no combate à desinformação. “Seria melhor pensar uma iniciativa envolvendo esses diversos agentes (Judiciário, Legislativo, empresas do setor e sociedade civil) do que ficar nisso de aprovação de lei, que parece ser uma solução, mas não aborda o tema em toda a sua complexidade”, declara.

Para ela, o texto é de fato muito vago. “Ela não define o que é notícia falsa, quem vai fazer a averiguação ou procedimentos que possam ser adotados para a definição ou para recursos da decisão”, diz. “É um tema muito complexo, que não pode ser resolvido com medidas simplistas”.

Para ambos os pesquisadores, o combate às fake news precisa ser feito de uma forma multidisciplinar. Helena afirma que “geralmente as regras que atendem a internet (são assim)”. Rais questiona inclusive se os Estados têm competência para uma legislação do tipo, já que a regulamentação de telecomunicações é uma competência federal. “O combate à desinformação precisa ser multidisciplinar. Não pode envolver apenas uma área, ainda mais em apenas um ente da federação”, declara.

Antifake
Nem só de legislação vivem as medidas de combate às fake news. O Governo do Estado lançou sua própria agência de checagem de informações, a Antifake CE. De acordo com o governo estadual, a medida serve como um “canal de esclarecimento para a sociedade de informações claramente distorcidas que viralizam em redes sociais” e “espaço oficial para a população recorrer e constatar a veracidade ou não de determinada notícia ou postagem”. As informações que serão analisadas são escolhidas de acordo com demandas da população.

O professor Diogo Rais questiona o termo. “Talvez o ponto mais perigoso, pois presupõe isenção da agência de checagem. Vinculada ao governo, (a Antifake CE) não teria essa autonomia”, diz. Para ele, seria mais positivo investir no Portal da Transparência. “Poderíamos ter a mesma ação, mas de outra forma. Assim, o governo não se colocaria como dono da verdade, mas detentor da informação”, declara.

O governo diz que não deixou o Portal da Transparência de lado, e que ele é bem avaliado por órgãos como Ministério Público Federal e Controladoria Geral da União e Transparência Internacional. “Enxergamos, contudo, que a Antifake CE complementa o trabalho do Portal, visto que o esclarecimento de fakes news não estão no escopo da legislação dos portais da transparência”, escreve o governo em nota.

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