Opinião

O terno do Waldick – Totonho Laprovitera

A Eliseu Batista Filho.

“Perdão foi feito pra gente pedir.” (Mário Lago)

Neste teimoso tempo de pandemia, matutando sobre a devoção do perdão, lembrei-me da seguinte história.

Ícone da música classificada como brega, Waldick Soriano foi se apresentar na cidade cearense do Icó, nos anos 70. Para se resguardar do grande assédio que habitualmente passava, decidiu se hospedar na cidade vizinha.

Em Orós, acolheu-se no Hotel Municipal, que era um primor de equipamento. Bem projetado pelo renomado arquiteto Neudson Braga, na época, o hotel não deixava a desejar em nada à nenhum meio de hospedagem do Ceará.

Festejado em sua chegada, Waldick foi conduzido ao conforto de seus aposentos, ao mesmo tempo em que lhe mostraram o roteiro turístico da cidade. Tempo lhe sobrava, pois só se apresentaria na noite seguinte. Então, Waldick teria a manhã inteira e parte da tarde para conhecer os belos recantos do lugar e desfrutar do carinho daquela gente tão hospitaleira.

No outro dia, antes de começar a programação, pediu à camareira para arrumar o seu alinhado paletó. Vaidoso, prometendo-lhe gorda gorjeta, recomendou cuidados especiais, pois era um terno de pano de boa sonoridade, bem cortado, com bom caimento, de estilo e fina etiqueta. Tudo organizado, cedo seguiu ao célebre e colossal Açude Orós. Controlando-se quanto aos exageros, comediu-se nos drinques e à tarde retornou ao hotel para almoçar um bem preparado, suculento e fresco tucunaré.

Quando beliscava a entrada de isca de tilápia na cerveja e sorvia um conhaque como aperitivo, espiou pela janela do restaurante que dava para a área de serviço do prédio e, bruscamente surpreso, avistou o seu valioso terno, todo engelhado e pendurado em um esticado varal de arame!

Para seu desespero e por excesso de zelo da camareira, o terno foi encaminhado à lavanderia, sem levar em conta a recomendação na etiqueta de que a peça só poderia ser lavada a seco! Fã de carteirinha do cantor, para agradar o seu ídolo, a lavadeira achou de lavar o paletó no capricho, com bastante esfregado de sabão em barra Caboclo, e deu no que deu.

Daí, formou-se a confusão! O cantor revoltou-se e queria porque queria que dessem um jeito no seu paletó, o que não foi possível.

Depois de muitas tentativas, conseguiram engomar o terno de tal maneira, que ele começou a ficar parecido com um jaleco de papelão envernizado à asa de barata. Ofereceram outros ternos para ele se apresentar no Icó: um do Pedro Augusto, outro do Fransquim Picarete, e até do Eliseu Filho, mas Waldick recusou. Apesar do gerente do hotel pedir mil desculpas, Waldick também não aliviou e nem perdoou seu ninguém.

Dizem que, por pura teimosia, Eurípedes Waldick Soriano se apresentou com o finado paletó no Icó e que ninguém nem prestou atenção na elegância dele ou não. Afinal de contas, todos só queriam curtir as suas românticas canções.

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