Opinião

Mariola Landowska, os índios e as mangas azedas – Aldonso Palácio

Vivência Sentimental, 120x100cm

Arte é um registro no tempo que expressa um sentimento, uma visão sobre o mundo. É uma maneira de aprender sobre outras culturas, outras emoções, outras visões. Enfim, praticar alteridade e tentar quebrar a casca da nossa própria história socialmente construída. 

Mariola Landowska é artista plástica nascida na Polônia, residente em Portugal e com grande interesse na natureza e nos povos originários do território brasileiro. Ela já conviveu com os Pi-Kiriris na Bahia e os Fulniôs em Pernambuco. Sua última vivência em 2016 requereu meses de preparação e autorização da Funai. Ao entrar na aldeia indígena Mebengokre-Kayapó, no cerrado paraense, um dos maiores biomas do mundo, a artista percebeu que para os índios uma vida de fartura tratava-se de ilusão. Coleta e colheita eram lentas e difíceis. Lá inserida, ela saía com as mulheres atrás de banana, açaí, plantas medicinais, lenha e pedras. Os homens caçavam e pescavam, mas raramente era suficiente para todos. As frondosas mangueiras davam muita sombra, mas presenteavam a aldeia somente com mangas ácidas, assim como a labuta árdua daquele povo pela subsistência. Mariola compartilhava os silêncios e as risadas das mulheres que só falavam o dialeto Kayapó. Com o tempo o respeito da artista pela coragem e força desse povo só crescia. Tudo emanava uma energia vital – o calor, os ritos, a umidade, sons, odores, a tinta de urucum na pele. A vida na aldeia era como uma miniatura do cosmo. 

Para Mariola Landowska, a manga azeda da aldeia, fruta estrangeira, introduzida no Brasil pelos portugueses, transformou-se em símbolo confessional da capacidade dos seres de adaptação e resiliência. A pintura de Mariola parte de um lugar de proximidade, de profundo conhecimento das pequenas e grandes lutas desse povoado. “Os indígenas são exímios mestres na beleza do existir e do deixar ser – e não há nada mais esmagador do que deixar ser. Eles são símbolos de sabedoria para com a natureza. Quando voltei, nunca mais fui a mesma”, diz a artista. 

 

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