Economia

Brasil: reforma da Previdência completa dois anos em meio a críticas e resultados inexpressivos

Aprovada pelo Congresso Nacional no dia 12 de novembro de 2019, mudanças nas regras da aposentadoria prometiam contribuir com o ajuste fiscal no País, reduzir a estimativa de despesa e, principalmente, garantir equidade entre beneficiários do INSS

De janeiro a novembro deste ano, o déficit previdenciário ficou em R$ 224,36 bilhões, segundo dados do TCU (Foto: Rivaldo Gomes/Folhapress)

Crisley Cavalcante
economia@ootimista.com

Ajudar a contribuir com o ajuste fiscal no País, reduzir a estimativa de despesa no futuro e, principalmente, prover equidade entre os beneficiários eram os principais apelos do governo federal para aprovar a reforma da Previdência Social, aprovada no Congresso Nacional no dia 12 de novembro de 2019. Dois anos após, será que a mudança tem conseguido atingir os objetivos previstos?

Entre as principais e mais acentuadas mudanças, estão a instituição de novas idades de aposentadoria, tempo mínimo de contribuição, regras de transição para quem já é segurado e novas alíquotas de contribuição. Inicialmente, a expectativa do governo era que a reforma garantiria economia de mais de R$ 1 trilhão aos cofres públicos. Depois, a projeção caiu para cerca de R$ 800 bilhões.

Na avaliação do economista e membro do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), Davi Azim, as mudanças eram necessárias para aliviar o peso sobre os cofres públicos, mas a pandemia de covid-19 dificultou ainda mais a situação previdenciária do Brasil.

“A reforma foi um remédio amargo, mas necessário. Em 2030, sem a mudança, o País não teria condições de pagar essa conta social do jeito que estavam as despesas. É claro que, no âmbito social, existem dificuldades para a concessão do benefício, e isso é preocupante em alguns aspectos. O fato é que, no atual momento, principalmente em razão da pandemia que deteriorou muito as contas públicas, afetando a renda das famílias, consumo de bens e serviços, a situação econômica ficou ainda pior”, analisa.

Déficit

Em 2018, o déficit previdenciário alcançou o maior patamar dos últimos dez anos: R$ 290,2 bilhões, equivalendo a mais de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Em 2019, recuou um pouco e registrou R$ 288,7 bilhões de déficit para, em 2020, alcançar R$ 363,0 bilhões, equivalentes a 4,9% do PIB. De janeiro a novembro deste ano, o déficit ficou em R$ 224,36 bilhões, segundo dados são do Tribunal de Contas da União (TCU).

Especialista em Previdência Social, o advogado Renan Elias diz que a reforma não melhorou a vida do brasileiro. “Trouxe mudanças bastantes significativas nos cálculos de benefícios que tornaram ainda mais difícil conquistar a aposentadoria e com valores menores do que eram praticados antes da reforma. Muitas regras ainda não foram apreciadas pelo Judiciário, tendo ainda chances de serem consideradas inconstitucionais, chegando a reduzir mais de 50% do valor. Alguns tribunais já estão começando a decidir contrários, fundamentados no princípio da vedação ao retrocesso”, afirma, citando como exemplo as mudanças inseridas na pensão por morte.

Segundo o advogado, é fundamental que o contribuinte consulte um especialista. “As regras já eram complexas antes, agora estão ainda mais. A justificativa do governo de que a mudança geraria equidade não prospera. A Previdência tem a função de resguardar a mínima dignidade das pessoas idosas, deficientes e carentes, diante de risco social. Quando esses direitos são retirados, existe um impacto a ser sofrido pela população, e foi isso que ocorreu. É uma reforma feita de maneira açodada e que não beneficia a população que mais precisa”, destaca.

Regras

De acordo com a regra geral, atualmente os trabalhadores se aposentarão a partir dos 62 anos, no caso das mulheres, e 65 anos para homens. As mulheres devem ter 15 anos mínimos de contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Os homens que já trabalhavam formalmente também precisam contribuir por 15 anos, mas os que ainda não entraram no mercado de trabalho terão de contribuir por, no mínimo, cinco anos a mais.

O cálculo do benefício que vai se basear na média de todos os salários do trabalhador é outra mudança relevante. Além disso, com 20 anos de contribuição, os trabalhadores homens terão apenas 60% da média. Esse percentual sobe dois pontos por cada ano de trabalho a mais.

Além disso, a reforma também reduziu a pensão por morte em 40% nos casos em que o único dependente é o cônjuge. Isso quer dizer que, se o segurado que morreu era aposentado, antes a viúva receberia 100% do valor do benefício. Com a mudança, o valor é de 50% da aposentadoria, mais 10% para cada dependente, limitado a 100%. Uma viúva sem dependentes, por exemplo, receberá 60% do valor da aposentadoria do segurado que morreu.

A acumulação de pensão com aposentadoria também mudou. Hoje, a pensão é equivalente a 50% do valor da aposentadoria do segurado, acrescida de cotas de 10 pontos percentuais por dependente, até o máximo de 100%.

Outro mudança aplicada é a de que os entes federativos com Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) precisam instituir regime de previdência complementar e adotar o teto de benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) no prazo de até dois anos.

Principais mudanças

Idade mínima: 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.

Tempo mínimo de contribuição: 15 anos para mulheres e 20 para homens no setor privado, e 20 para homens e mulheres no caso de servidores públicos.

Regras de transição: para o trabalhador ativo tanto do setor privado quanto para servidores.

Valor da aposentadoria: do setor privado e de servidores públicos será calculado com base na média de todo o histórico de contribuições, não descartando as 20% mais baixas;

Para servidores públicos, a regra é semelhante à do INSS, mas valerá somente para quem ingressou após 2003;

Para aqueles que ingressaram até 31 de dezembro de 2003, o valor do último salário será mantido para quem se aposentar aos 65 anos (homens) ou 62 (mulheres).

Valor descontado do salário de cada trabalhador: quem ganha menos vai contribuir menos para o INSS. Quem ganha mais vai contribuir mais.

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